quarta-feira, 15 de abril de 2009


Quase sinto uma aversão pelo ser humano, a sua condição incomoda-me.
A busca pela autonomia, independência, a ilusão de liberdade, o ser enquanto existo acima de tudo, de qualquer deus ou força maior, fisicamente desprovido de forças superiores, incapazes, dependente de outrem… sim… no meio de uma multidão avisto umas pernas deitadas na estrada… o meu coração estremece, o sentimento de culpa, de incapacidade, e ali está, um ser incapaz, jorrando sangue, dependente da compaixão, pena até, de um outro ser alheio a tudo o que se passa… é avassalador o confronto com a vida e morte, com a incapacidade que nos foi conferida… a condição de que mais cedo ou mais tarde serei eu, deitada, jorrando sangue, dependendo… arrepiante, como toda a autonomia, independência, liberdade nada faz para nos tirar da situação de sufoco, e só apenas alguém o poderá fazer por nos… enoja-me…
Não faz sentido a existência com o fim de um dia inexistir… uso como exemplo próximo a vivência dos meus pais, observo e reflicto, a inconsciência de um, a ignorância face á sua condição, a vida despreocupada, para no fim lutar por segundos, a consciência exagerada e obsessiva do outro, lutando todos os dias pelos segundos a mais finais, duas vidas de extremos conjugadas numa, em que o fruto é alguém inconscientemente consciente da sua condição. Concluo que a morte me assombra, sem dúvida, mas mais que ela, assombra-me a vida. Mais precisamente ter de viver para morrer.
Persegue-me o medo das alturas, as vertigens, as falésias, os abismos, e por vezes questiono-me se será medo de cair, ou medo de ter coragem de me atirar, todos os dias, em diferentes contextos imagino inúmeras possibilidades de morte, seja de pessoas em redor, a minha, ou mesmo quando passeio a chanel na rua, quando atravesso a estrada, e imagino uma roda sobre uma espécie de papa presa á trela que seguro na mão… o quanto me magoa, o quanto no fundo do meu ser sei que nunca magoaria ninguém e muito menos a mim própria embora seja consciente que temos esse direito e possibilidade, e se o fizesse por algum motivo, o quanto me destruiria, e o quanto não consigo evitar imaginar… tenho a certeza de que estes pensamentos quase psicóticos não me atormentam apenas a mim, e por isso não me incomodam nem me desencorajam, mas essa parte não material do ser humano, essa consciência da qual eu preferia ser desprovida somada á condição física, faz-me por vezes questionar-me a mim própria, é controverso afirmar-me como alguém que sabe quem é, de onde veio e para onde vai, ter a certeza, ou pelo menos ter fé, na vida para alem da morte, viver confrontada com questões às quais nunca terei resposta.
Então somos o exemplo da auto-destruição, consciente, lenta e regulada, morte adiada, e ali estou eu, em cima de um pedaço de terra que esconde um abismo atrás, saboreando a brisa e um dos muitos momentos passados á beira mar, e as pernas não tremem mas o coração salta.

5 comentários:

Tari disse...

"...Só as perguntas mais ingénuas são realmente perguntas importantes. São as interrogações para as quais não há resposta. Uma pergunta para a qual não há resposta é um obstáculo para lá do qual não se pode passar.
Ou por outras palavras: são precisamente as perguntas para as quais não há resposta que marcam os limites das possibilidades humanas e traçam as fronteiras da nossa existência".

Milan Kundera in a insustentável leveza do ser.

:P

disse...

"O que é vertigem? Medo de cair? Mas porque temos vertigem num mirante cercado por uma balaustra sólida? Vertigem não é o medo de cair, é outra coisa. É a voz do vazio debaixo de nós, que nos atrae e nos envolve, é o desejo da queda do qual nos defendemos aterrorizados."

jardel disse...

MUITO BOM...sinceramente! Pá cabeça.

fuinhu disse...

e de pensar que ontem ia tendo um acidente e me ia desfazendo todo...

fred disse...

muda la a fotinha! :P